Depois de quase quinze anos de sala de aula, os professores acumulam experiências, estresses e alunos dos quais nunca se esquecerão. Comigo não é diferente. Há muitos deles irremediavelmente presos à minha memória, em função dos mais variados motivos. A aluna sobre quem tratarei neste texto é objeto de minha profunda admiração.
Tudo começou durante o recreio de um dia corriqueiro de aula. Ela era, até então, uma aluna normal. Mas naquele dia, as coisas começaram a mudar. Eu estava sentado, como de hábito, no pátio externo da escola. Os alunos num vaivém desordenado e muita falaria. Do outro lado, no corredor, ela vinha se aproximando tranquilamente. De súbito, ela caiu. Entretanto, não foi uma queda normal. Ela simplesmente desabou, como um prédio que é implodido. O interessante é que ela sequer esbarrou em algum objeto, nem tropeçou, nem foi empurrada, nem escorregou, nem teve mal súbito, nem desmaiou. Ela desceu numa trajetória vertical, produzindo um barulho (bufo!). Isso chamou minha atenção: "Essa menina é diferente!", pensei.
Algum tempo depois, minha suspeita foi confirmada. Tratava-se de alguém muito especial. Certo dia, por exemplo, eu estava na frente da escola - que fica próximo à residência da menina - e vi quando ela guiava sua moto em alta velocidade. De repente, ela deu seta para a esquerda, empinou a moto, invadiu a sala de estar de sua casa e estacionou a moto entre o criado mudo e o sofá. Foi impressionante! Minha admiração crescia em progressão geométrica, enquanto ela mostrava o quão especial era. Foi assim no dia em que desdenhou da minha ajuda, na academia, ao carregar uma anilha de 25kg e no dia em que ela bebeu 2ml de corretivo numa "brincadeira" com colegas de sala de aula.
Mas o momento mais emblemático, aquele que elevou minha admiração a níveis estratosféricos, aconteceu algum tempo depois, já em outra escola.
Eu vinha caminhando pelo corredor, quando vi um menino saindo de uma outra sala, em disparada, sendo perseguido por ela. Eu imagino que ele deve ter aprontado alguma coisa. Ela, muito agilmente, pegou o menino pelo pescoço, passou uma de suas pernas por entre as pernas dele e fez uma alavanca, de modo que o menino, franzino, girou em torno de seu próprio eixo (um giro de 360 graus por cima da cabeça) e caiu prontinho, sentado, engalhado no recanto da parede, com uma cara de choro, balbuciando uma expressão muito parecida com "me perdoe!". Aquilo foi incrível. Foi certamente um lindo ippon. Eu confesso que fiquei emocionado e nunca mais aquela imagem artística e sutil saiu da minha retina.
São essas coisas que fazem os alunos seres tão especiais, cada um com suas idiossincrasias...
Um abraço!
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